sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Expressando emoções

Emoções são uma das expressões literárias mais intensas e, às vezes, mais difíceis de serem escritas. Emoções vão da alegria exarcebada à tristeza ou depressão profundas. As emoções são bem expressas quando o leitor sente realmente aquilo que o personagem está atravessando. Essa difícil empatia com o leitor só é conseguida quando o escritor consegue transcrever para o texto os sentimentos físicos que aquela emoção causa em seu personagem, sem expressar substantivamente as emoções que afetam o personagem naquele determinado momento. Em outras palavras, a boa técnica literária evita, por exemplo, o uso das palavras designativas da própria emoção sentida: medo, coragem, alegria, êxtase, etc. O interessante é “mostrar” ao autor o que o personagem está sentindo sem “dizer” que emoção é aquela.

Observe, por exemplo, esta frase:

- Ela abriu a porta com cuidado. Estava com medo do que veria lá fora.

Neste caso, o leitor sabe que o personagem está com medo, mas não “sente” o medo que realmente emana da situação. A mesma frase, escrita de outra maneira, faz com que o leitor compartilhe com o personagem a cena descrita.

Por exemplo:

- Ela tocou o trinco da porta. Seus dedos tremiam. Um frio estranho nas mãos, inconsistente com o calor do verão que já se aproximava, subiu-lhe pelos braços e desceu pelas costas, provocando um calafrio incontrolável. Sua mão pressionou o trinco mais para baixo e a porta se mexeu. Um vento quente entrou pelo pequeno espaço entre a porta e a parede. Não havia mais volta. O que estivesse ali fora já poderia entrar.

Sentiram a diferença? Em nenhum momento no segundo texto a palavra MEDO foi mencionada, mas não há dúvidas de que o personagem estava apavorado.

É bom evitar também o uso exagerado de clichês ou lugar-comum ao descrever as emoções: “coração que palpita” e “suor na testa”, por exemplo, são algumas das frases usadas e abusadas para descrever “amor” e “nervosismo”.

Esses pequenos detalhes técnicos abrem ao escritor um leque de possibilidades para atingir mais profundamente o leitor e deixá-lo mais próximo da história e do personagem. Em textos futuros eu explorarei mais este tema.

Até a próxima
Stanze

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Actio Inspirandum

Esta semana estréia em várias salas de cinema no mundo a primeira parte da última etapa da trajetória Harry Potter. Seria impossível, em um blog sobre a arte de escrever, não falar do fenômeno que é o garoto/adolescente bruxo e, principalmente, da mente criativa atrás da varinha mágica, JK Rowling.

Para os apreciadores de um bom livro e que não têm preconceitos temáticos eu aconselho a leitura da epopéia do garoto Potter, por vários motivos:

1 – é invariavelmente uma sensação mundial e para não ficar isolado dos rumos da literatura adolescente atual;

2 – o tema é cativante e a trama é muito bem elaborada e se complementa a cada livro;

3 – os livros são, como de regra, mais abrangentes e interessantes que os filmes.

Em termos de técnica literária, JK Rowling usou elementos bem marcantes em sua obra: personagens  carismáticos (mesmo os maus), com personalidades próprias e distintas; história temporal em que os personagens se desenvolvem e crescem, fácil de observar na linguagem mais adulta que Rowling usa a cada livro da série; detalhes reconhecíveis, onde se vê que a autora se inspirou em fatos e coisas reais para criar o mundo mágico de Harry Potter, como, por exemplo, os uniformes de escola usados pelos mágicos, da mesma forma que os estudantes ingleses também usam, ou a própria escola Hogwarts, inspirada, creio eu, no Arthur Findlay College, um instituto especializado no ensino e aperfeiçoamento de fenômenos paranormais e mediúnicos.

Acima de tudo isso, Rowling usou energias essenciais para todo escritor que quer ver sua obra completa e publicada: perserverança, força de vontade e disciplina. Como oradora em uma formatura em Harvard, em 2008, Rowling falou sobre sua própria vitória contra circunstâncias desfavoráveis. Em um discurso emocionante a autora discorre sobre falhas e o medo de falhar. "O que constitui para cada um o medo? O mundo está ansioso para lhe dar critérios se você deixar" ela cita, reforçando o poder que cada um tem dentro de si, e que "não precisamos de mágica para transformar o mundo. Nós carregamos dentro de nós o poder que precisamos. Nós podemos imaginar sempre algo melhor."  

(Vídeo somente em inglês)

J.K. Rowling Speaks at Harvard Commencement from Harvard Magazine on Vimeo.

Mesmo que você não leia o livro ou discorde do talento de JK Rowling como escritora, leve essas palavras dela para sua vida e deixe a imaginação criar um mundo melhor, pois só assim conseguimos atingir os objetivos mais impossíveis.


Até a próxima
Stanze

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Deixemos de entretanto e vamos logo para os finalmente...

Odorico Paraguaçu foi uma figura notória da televisão brasileira. Seu palavreado é exclusivo e sua obsessão em inaugurar o cemitério, ponto maior da sua campanha para prefeito de Sucupira, é hilária.

Dias Gomes criou um personagem que, embora fosse cínico, corrupto e interesseiro, era adorado pelo público. Isso porque sua genialidade criativa trouxe às telas um linguajar único e criativo. A isso se chama neologismo, que pode ser tanto a criação de uma palavra nova quanto dar um significado diferente a uma palavra já existente.

Alguns exemplos de neologismos são trekkie, termo usado para os fãs de Jornada nas Estrelas (Star Trek em inglês), ou papamóvel. Há vários tipos de neologismo, como os causados por derivação prefixal, tipo desfeliz, desinquieto,  ou derivação sufixal, como assinzinho, mesminho. O prof. Teotônio Marques Filhos, no site Por Trás das Letras, analisa os vários tipos de neologismos em um estudo sobre a obra Sagarana, de Guimarães Rosa. Confira aqui.

O neologismo é um recurso interessante para se usar em uma obra literária, desde que feito com consistência e coerência com o personagem.

Odorico Paraguaçu usava o neologismo com classe e, embora fosse um sinal da sua ignorância, era ao mesmo tempo um forte traço da sua personalidade e seu discurso "politiqueiro".

Só para lembrar:

"Errar é humanum est, como dizem os latinos"
"Um homem que se preze não deve deixar barato seu corneamento"
"Um herói altamente alto, à altura de prestar um grande beneficiamento à população de Sucupira! Com esse herói mórbido, eu vou proceder à cerimônia inauguratícia do cemitério que construí com amor mortuário..."
"Não há humilhamento maior que o de ver um homem que viveu vetustamente ser levado numa rede, balançando a sua defuntice..."
"E com esse licor eu homageio a nossa jenipapança"

(extraído de O Bem Amado, livro da série Grandes Novelas, publicado pela Editora Globo)

Até a próxima
Stanze


 

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Memorizando

Estou de volta após umas maravilhosas férias em Portugal e Espanha. Nesse período tive a oportunidade de visitar locais interessantíssimos, cheios de energia. Pequenas cidades com histórias fortes e passados presentes.

Memorizar significa fixar algo na memória, através de imagens, repetições ou até imaginação. Memória é também lembrança, recordação. No Inspiracionando de hoje quero provocar a memória de vocês através de algumas fotos tiradas nesses lugares pelos quais passei. Lugares como Idanha-a-Velha em Portugal em que a população jovem se reduz a 2 pessoas. Ou como Toledo, na Espanha, com suas pontes incríveis e atmosfera mística. Monsanto e Sordelha, ambas em Portugal, cidades praticamente museus, em que se respira saudade de tempos idos, e onde pode-se sentir as histórias encrustradas nas pedras que as formam e rodeiam.






Um casal de idosos, arabescos nos edifícios e pontes, ruas de pedra vazias, tudo isso nos traz visões de um passado próximo ou distante e, sobretudo, inspiração para muitos escritos.

Até a próxima,
Stanze