quarta-feira, 3 de agosto de 2022

Uma trilogia americana




"O, how I wish I was in the land of cotton ..." (Oh, como eu desejaria estar na terra do algodão...), a voz suave e melodiosa que sai do computador enquanto eu trabalho é de Elvis e a música é aquela que se tornaria uma espécie de hino final dos shows ao vivo do cantor nos palcos dos Estados Unidos. E um hino é realmente o que An American Trilogy é. Na verdade, como diz o próprio nome, são três hinos. 

Em 1971, durante uma festa de Ação de Graças, repleto de estrelas de Hollywood, o compositor e cantor texano Mickey Newborn começou a cantar "Dixie", uma música que havia sido banida em vários estados norte-americanos nos anos 50 e 60, por sua associação com o escravagismo e os campos de algodão sulistas. Um silêncio profundo invadiu a platéia, fazendo com que a música se elevasse além do palco e tocasse profundamente dentro de cada pessoa presente. Em seguida ele puxou o 'glória, glória, aleluia' do Battle Hymn of Republic, que era um canto de marcha dos soldados nortistas. O Norte e o Sul, separados pela guerra, estavam novamente unidos naquela composição. 

Para finalizar - talvez até para homenagear alguns cantores gospel presentes -, ele adicionou trechos da balada spiritual "All My Trials", que ficou popularizada na mesma época em que Dixie foi banida, nos anos 50 e 60, como um hino de protesto dos crescentes movimentos sociais contra a discriminação racial.  Assim nascia, naquele palco e naquele momento, "An American Trilogy", uma canção com raízes na dor, na história e na luta pela igualdade e liberdade.

Eu fecho os olhos por um momento e deixo que a melodia e a letra, com todo o sentimentalismo e força característicos do modo como Elvis interpretava as suas canções, me absorva. De repente eu estou no Sul dos Estados Unidos, observando os campos cultivados com as flores brancas do algodão, para passar aos tambores e marcha das botas dos soldados nortistas, trazendo uma esperança de mudança, para entrar nas casas dos guetos, onde o próprio Elvis também tinha as suas origens. A música termina. Eu retorno ao trabalho com mais energia, acreditando que cada ação que fazemos é uma ação de mudança e que a música será sempre um símbolo catártico dessas mudanças. 

(Referência: https://www.savingcountrymusic.com)